A conta vai para os filhos e netos

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Em evento organizado pela Confederação Nacional do Comércio, o então ministro do Planejamento Dyogo Oliveira informou que 57% de todo o gasto do governo hoje é com a Previdência e apenas 2% com investimento. E afirmou: “Estamos gastando com o passado e nada com o futuro”. Considerando que as contas públicas apresentaram déficit de R$ 124,4 bilhões em 2017, as demais contas do orçamento tiveram que fazer um superávit de R$ 144 bilhões para cobrir o rombo de R$ 268 bilhões da Previdência. O que estaria emperrando a aprovação da reforma, segundo o ministro, seria principalmente a pressão de setores que hoje são indevidamente beneficiados para manter privilégios.

O economista José Márcio Camargo, professor da PUC Rio, observou, no mesmo evento que “se hoje gastamos 57% do orçamento com Previdência Social, em 20 anos serão 100%”. Com os sucessivos adiamentos, a cada dia perdido a reforma terá que ser mais dura. E ainda: o rombo dos benefícios pagos ao setor público somou R$ 1,292 trilhão entre 2001 e 2015, muito mais do que o governo gastou com saúde e educação nesse período. Na sua avaliação, a Previdência tende a ser hoje o maior mecanismo de concentração de renda no país.

O nosso problema de seguridade social é provocado por um misto de envelhecimento acelerado da população, privilégios, má gestão, desvio e aposentadorias precoces. No que se refere à idade média de aposentadoria, levantamento feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que os 59 anos de aposentadoria do Brasil são incompatíveis com a curva demográfica do país, especialmente se comparados com a idade de outras nações: média de 64 anos nos países da OCDE, chegando a 69 no Chile e Japão, a 71 na Coreia do Sul e 72 no México. Alemanha, Estados Unidos e Holanda, por exemplo, já aprovaram regras para elevar a idade mínima para 67 anos, com igualdade de regras para homens e mulheres. Na Alemanha, existe um período de transição até 2029 para os nascidos até 1964. Para os demais, já vale o aumento de 65 para 67 anos.

No Japão, país com a maior proporção de idosos na população, existe uma lei que obriga reforma da Previdência a cada cinco anos. Todos os países que praticam a responsabilidade fiscal buscam de forma ordenada adequar as regras à sua curva demográfica e à realidade orçamentária. No Brasil, precisamos entender que ninguém resolverá esse problema por nós, e que adiamentos e desidratações da proposta simplesmente transferem um pouco para a frente contas cada vez mais altas a pagar, especialmente pela população mais pobre, que não passa de massa de manobra daqueles que defendem privilégios. Isso fica claro nas informações fornecidas pelo secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano: na proposta apresentada em dezembro último, apenas 9,5% dos trabalhadores teriam uma perda de renda superior a 1% da aposentadoria, poupando a população mais carente.

Os generosos fluxos de recursos, que privilegiaram o Rio de Janeiro na Copa do Mundo, nas Olimpíadas e com royalties do petróleo, não foram suficientes para compensar a falta de gestão e a corrupção no governo do estado. Com a intervenção decretada, a União passa a coordenar os esforços da segurança em meio ao caos que tomou conta do Rio. Com o dinheiro dos contribuintes de todo o país. Com isso, a votação da reforma da Previdência teve que ser suspensa por determinação constitucional. Temos ouvido, de políticos e jornalistas, que foi uma grande derrota do governo. Leitura equivocada. A derrota claramente é do país. Não podemos esquecer que os excessos que cometemos hoje são exatamente a conta que estamos transferindo aos nossos filhos e netos. Não creio que queiramos isso.

 

Publicado no dia 18/04 no jornal O Estado de Minas.

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