Recolocar as contas em dia

A Covid-19 tem obrigado governos a usar bazucas em canhões para enfrentar um inimigo invisível. De um lado, um confinamento que derruba a demanda, e de outro, a paralisação de quem produz aleijando a oferta. Uma recessão generalizada já é certa em 2020.

Ok, Estado de Calamidade Pública significa que a situação é anormal, que devemos aplicar medidas não convencionais. Não há dúvidas, a prioridade é salvar vidas. Mas será que vale tudo, que alguém nos garante o direito de gastar sem arcar com as consequências? O que pode advir da explosão do desemprego, da evaporação da renda das famílias, de problemas emocionais outros mais?

Tradicionalmente, governos combatem restrições com política monetária. Reduzir taxa de juros é simples, rápido, fácil de reverter e traz menos problemas para o futuro. Mas é uma ferramenta indisponível, hoje, na maior parte dos países, dados os níveis historicamente reduzidos dos juros.

Por esse motivo, e também pelo fato de o confinamento levar a uma queda bruta de liquidez de famílias e empresas, a principal alternativa passa a ser a política fiscal, o aumento dos gastos dos governos, para tentar manter a economia rodando.

Só que as políticas fiscais são remédios que curam, mas podem ao mesmo tempo deixar efeitos colaterais perigosos.

Basta ver o que fizemos no Brasil para enfrentar a crise de 2008. Equivocadamente, optamos à época para realizar um forte aumento de gastos públicos permanentes, que, portanto, não puderam ser eliminados mesmo após a crise.

Isso levou a um processo perverso de transferência de recursos da sociedade para o poder público, para manter uma máquina governamental que absorve em torno de 20% do PIB, estrangulando a capacidade do governo e do setor privado de investir, com as consequências nefastas na produtividade da economia e na capacidade das empresas de competir.

O resultado foi a recessão de 2015 e 2016. Devemos aprender com os erros. O ministro da Economia Paulo Guedes sabe disso e propôs um “Orçamento de Guerra”, segregado do orçamento regular. Gastos temporários de combate a pandemia, e não permanentes.

Temos que enfrentar este enorme inesperado e assustador desafio trazido pelo fenômeno do novo coronavírus com maturidade. O pós-Covid-19 vai trazer desafios e oportunidades.

Recolocar as contas em dia exigirá grande esforço e sacrifícios futuros. Então, quanto mais responsabilidade fiscal tivermos agora, menores as privações futuras, e melhores condições teremos para embarcar numa recuperação da economia mundial prevista para 2021.

Publicado no Jornal O Pioneiro (RS) em 06.07.2020.

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