Em junho o International Institute for Management Development (IMD) divulgou seu ranking de competitividade de países. O Brasil ficou na 60ª posição entre 64 economias avaliadas, em função da baixa eficiência do Governo, ambiente de negócios e infraestrutura. Os fatores são intimamente relacionados, conforme demonstra Carlos Rodolfo Schneider, dirigente do Grupo H. Carlos Schneider. Ele esteve à frente do Movimento Brasil Eficiente, que criou subsídios e apresentou propostas concretas para melhorar a situação fiscal do País. O Movimento foi encerrado, mas suas causas permanecem atualíssimas.
Carlos Rodolfo Schneider: “No Brasil e em outros países o aumento de gastos via aumento de tributos tem gerado resultados muito mais tímidos do que redução de gastos com aumento de eficiência” – Foto: Divulgação
Qual é a relação da ineficiência do setor público com os fracos resultados econômicos do País?
Por definição, a eficiência do gasto do setor público é inferior à eficiência do gasto privado, até mesmo pelas necessárias amarras e controles existentes no setor público. Isso significa que quanto mais recursos forem transferidos da sociedade para o Estado, maior é a ineficiência na alocação dos recursos do Brasil. Nas últimas décadas a carga tributária subiu de 25% para 35% do PIB, enquanto os investimentos baixaram de 25% do PIB nos anos 1990 para 15% a 18%. Nossa produtividade e competitividade são baixas devido a fatores interligados, como baixa taxa de investimentos, alta carga tributária e baixa disponibilidade de poupança interna, que é capturada pelo setor público.
É possível falar em redução do setor público atualmente?
A escolha não é entre estado grande ou pequeno, é entre estado forte e ágil, que apoia os agentes econômicos, versus estado obeso e ineficiente, ainda que o grande seja pouco amigo do eficiente. O Brasil tem a maior carga tributária entre os países em desenvolvimento e a pior relação do planeta entre impostos cobrados e retorno à sociedade – vários estudos já demonstraram isso. Impostos foram criados para o Governo prestar serviços à sociedade, mas hoje são majoritariamente usados para manter a máquina pública, que consome perto de 20% do PIB. O Estado precisa aprender a gastar com mais eficiência a enorme quantidade de recursos que arrecada. O avanço neste ponto seria gastar melhor, e não mais. O gasto em educação, por exemplo, é de 6% do PIB, mais do que países com colocações melhores no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA). Nós estamos entre os últimos. O gasto é pouco eficiente também em saúde, segurança e várias áreas onde o Estado atua.
O que esperar da Reforma Tributária?
Em primeiro lugar a simplificação de estrutura, que é caótica. A simplificação talvez agora ande, mas outro ponto é a redução da carga tributária – é importantíssimo falar disso depois. Para baixar tributos tem que reduzir o gasto público, o que não se viabiliza sem a reforma administrativa. Deve-se pensar nela sem demora.
Por que é tão difícil realizar reformas?
A sociedade tem dificuldade para fazer escolhas, como se estamos dispostos a fazer sacrifícios de curto prazo para colher resultados no futuro. Outra dificuldade é que todos são a favor de reformas, desde que não mexam com os seus direitos. A Constituição de 1988, com muitos direitos e poucas obrigações, foi uma escolha que nos cobra um preço: o crescimento do País é muito menor do que poderia ser. Outro ponto é a falta de senso de urgência, o hábito de procrastinar mudanças. Por exemplo, a falta de regulamentação de vários artigos da lei de responsabilidade fiscal editada no ano 2000. A lei prevê a criação do conselho de gestão fiscal, que seria um xerife das contas públicas. No Movimento Brasil Eficiente propusemos a criação do Conselho, que se tornou projeto de lei do senador Paulo Bauer aprovado por unanimidade no Senado em 2015. Porém, na Câmara dos Deputados sofreu alterações que precisam ser revistas. A gente acaba lutando pelas mudanças politicamente possíveis, este é até um termo corriqueiro hoje em dia no Brasil, e pouco se comenta sobre o que é realmente necessário. É lógico que em um regime democrático as mudanças devem ser negociadas, mas temos nos conformado com avanços modestos.
O que é politicamente possível mudar no momento?
O Estado tem que ter um gasto menor. Se transferirmos mais de 30% do PIB já estamos fazendo uma escolha, mas o Estado pode fazer um esforço para gastar melhor. Toda vez que se fala em obter recursos no Brasil a questão é quem vai pagar mais impostos, mas não se fala em cortar gastos. No Movimento propusemos a criação de uma Secretaria da Despesa Federal, que poderia ser formada por quadros da Receita Federal, para não onerar o Estado. É gente muito capacitada que poderia ajudar o País a gastar melhor. Também é fundamental rever regras orçamentárias para não sacrificar investimentos. Praticamente 95% do orçamento é gasto obrigatório, não sobra para investimentos. Outro ponto é a crescente ingerência do legislativo no orçamento público sem ter a responsabilidade de equilíbrio das contas, que cabe ao executivo. Deveria se estabelecer modelos em que todos respondessem pelo equilíbrio.
Visões políticas sobre desenvolvimento econômico levam o País para qual direção?
A PEC da transição autorizou gastos extras de mais de R$ 150 bilhões, o que mostra tendência a gastos. O pretexto eram os compromissos sociais de campanha, mas o valor ficou muito acima disso, então a PEC foi muito mais um guarda-chuva para permitir ao Governo gastar sem priorizar. A preocupação com o social e o crescimento para gerar empregos é legítima, sem dúvida, mas a forma de promover isso é que faz toda a diferença. No Brasil e em outros países o aumento de gastos via aumento de tributos tem gerado resultados muito mais tímidos do que redução de gastos com aumento de eficiência. O que sustenta crescimento sem inflação, o chamado PIB potencial, é investimento em infraestrutura, pesquisa, inovação, promoção internacional. Enquanto não fizermos ajustes para elevar o PIB potencial continuaremos com altos e baixos, repetindo voos de galinha.
O que fazer para melhorar o ambiente?
Reformas micro e macroeconômicas. Muitos problemas podem ser resolvidos com reformas infraconstitucionais, como vem acontecendo nos últimos anos com a independência do Banco Central, Lei da Liberdade Econômica e privatização da Eletrobras, por exemplo. Também houve reformas estruturantes, como a trabalhista e a previdenciária. Mas nossa defasagem é tão grande em relação a economias mais eficientes que temos de continuar com foco muito grande nos ajustes. Não basta sermos competitivos onde há vantagens comparativas como o agro, até porque cada setor tem o seu papel na economia, e a indústria é o setor que mais agrega produtividade. Em 1980 a capacidade industrial do Brasil equivalia à da China, Tailândia, Malásia e Coreia do Sul juntas – veja só o recuo. Hoje o valor adicionado pela indústria no PIB é de 10,2%, contra 22,9% do conjunto de países de renda média ao qual pertencemos. Isso é resultado, em grande parte, da queda de investimentos da indústria de transformação, que era 28% do total em 2008, mas recuou para 15%. A crescente dependência do agro, sem desmerecer a sua importância, nos torna dependentes dos ciclos de commodities, o que não está no nosso controle. A boa notícia é que o controle do futuro depende somente de fazermos a lição de casa.
Entrevista disponível em FIESC