Um condomínio chamado Brasil

Desperdiçamos o bônus demográfico e os frutos de um vigoroso boom de commodities, insistimos em transformar a máquina pública num fim em si mesmo

Ainda no ano de 2010, quando o Brasil se colocava como a bola da vez, imune à crise de 2008 — no máximo, sujeito a alguma marolinha — o Movimento Brasil Eficiente (MBE) divulgava uma cartilha concebida pelo cofundador do movimento, o economista Paulo Rabello de Castro, e produzida pelo cartunista Ziraldo, que retratava uma cena do “Condomínio Brasil”, onde nós, brasileiros, somos os condôminos e o governo, o síndico. A cena mostrava o edifício Brasil cheio de rachaduras e vidros quebrados enquanto, na cobertura, acontecia uma festa patrocinada pelo síndico. Passaram-se seis anos, os problemas no prédio aumentaram, mas a festa só acabou quando o caixa (quase) secou e os condôminos se rebelaram contra novos aumentos na taxa de condomínio e resolveram trocar o síndico. Esse quadro, que levou à criação do MBE em 2010, era visível, embora o governo federal e muitos governos estaduais e municipais não quisessem enxergá-lo. Poderíamos, com um esforço moderado, ter mudado a rota e estar hoje navegando em águas bem mais tranquilas.

Na época propusemos que os gastos correntes do governo crescessem menos que o PIB, a partir do aumento da sua eficiência, e que se simplificasse o caótico sistema tributário brasileiro. Seriam duas medidas que desencadeariam um processo de recuperação da competitividade sistêmica do país, criando um círculo virtuoso que permitiria, em dez anos, reduzir a carga tributária para 30% do PIB, aumentar a taxa de investimentos para 25% – com 5% em infraestrutura – e, com isso, garantir um crescimento sustentado de 4% ao ano para a economia.

Hoje já estaríamos quase chegando lá, não fosse o ditado que insistimos em cultivar: de que as coisas precisam piorar muito antes de melhorar. Em vez de fazermos a lição de casa, desperdiçamos o bônus demográfico e os frutos de um vigoroso boom de commodities, insistimos em transformar a máquina pública num fim em si mesmo, num feudo de privilégios cheio de benesses para seus integrantes e amigos. Apagaram-se as linhas divisórias entre o público e o privado, como bem mostra o criativo rol de nomenclaturas protagonizado pela Polícia Federal. Prestar serviços à sociedade que justifiquem a existência do poder público? Sorry, passou batido.

Agora que o prédio caiu, estamos começando a tomar as medidas que poderiam ter evitado o problema se adotadas a partir de 2010. E não faltaram reuniões com equipes do governo federal, com o Congresso, com governos estaduais. Alguns estados, que demonstraram maior compreensão e determinação, caminham hoje com mais tranquilidade.

A aprovação da PEC do Teto de Gastos foi um passo importante, somo será a reforma da Previdência e a trabalhista. Até porque, a continuar a trajetória anterior, de acordo com estudos da Fiesp, a dívida pública poderia chegar a quase 170% do PIB em 2025; a carga tributária, a 44,5%; e segundo Yoshiaki Nakano, diretor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas e um dos fundadores do MBE, a taxa de desemprego cresceria para 17%, o que provocaria delicada situação social e política.

De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, os gastos de custeio do governo (para manter a máquina pública) passaram de 14% do PIB em 1997 para mais de 20% em 2016. No fim do ano passado, o Ministério da Fazenda projetou que, se a PEC do Teto, aprovada no Congresso, tivesse sido adotada há dez anos, os gastos da União seriam hoje de 10% do PIB – metade da real –, confirmando as projeções do MBE de 2010. E podemos garantir que o país estaria investindo 25% e crescendo 4% ao ano. Com consistência. E o condomínio estaria preservado.

Carlos Rodolfo Schneider, empresário, é coordenador do Movimento Brasil Eficiente.

Publicado em 07/04/2017 no Jornal Gazeta do Povo – Curitiba/PR.

http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/um-condominio-chamado-brasil-5m0olj91qe1zx1jgowcr7u61w