O britânico JIM O’Neil criou, no início da década passada, a sigla Bric, reunindo os quatro principais países emergentes – Brasil, Rússia, Índia e China – por acreditar no potencial que teriam para puxar o crescimento mundial no século 21. Decepcionado, disse recentemente que “o Brasil parece ser apenas uma história impulsionada por commodities e sua economia, portanto, move-se de acordo com os ciclos de preço”. Para dizer o mínimo. Na realidade, somos hoje um país à deriva, porque não criamos as nossas âncoras, nem mesmo no período de bonança do superciclo das commodities e do bônus demográfico.
Não faz sentido querer calçar no aumento do consumo, e muito menos no consumo público, um projeto sustentável de longo prazo para o crescimento do país. Nem tampouco a demanda externa, por mais importante que seja, pode nos alavancar pelo baixo grau de internacionalização da nossa economia. O que impulsiona crescimento consistente é o aumento de investimento, apoiado por uma poupança interna forte. Nesse cenário, a nossa poupança, que já vinha insuficiente, caiu de 19/5 do PIB em 2008, para 13%, em 2014. O estímulo ao consumo das famílias e uma poupança pública negativa comprometem o esforço poupador das empresas privadas.
O quatro particular que vemos no Brasil, de recessão com inflação, é uma indicação de que a oferta e a demanda estão muito próximas, como alerta o ex-economista chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Oliver Blanchard. O novo problema maior é o crescimento galopante dos gastos públicos correntes, comprometendo o investimento. Num comparativo, entre janeiro de 2015 e janeiro de 2014, os gastos de custeio do governo cresceram 14,34% em termos nominais e 6,37% em termos reais e os investimentos caíram 35,44% em termos reais. A taxa de investimento total da economia vem caindo desde 2010: 19,5% do PIB para 16,7%, em 2014.
Uma ds frentes que mais requerem investimentos para permitir ao país continuar crescendo é a infraestrutura. Países crescem quando suas economias são competitivas, e bons portos, estradas, ferrovias, aeroportos, boa mobilidade urbana somam muito nesse aspecto. O “The Global Conpetitiveness Report 2015-2015”, do Fórum Econômico Mundial, mostra que esse, certamente, não é o nosso ponto forte. Entre 144 países pesquisados, as nossas ferrovias ocupam a 95ª posição, o transporte aéreo a 113ª, as estradas e portos a 122ª. Aqui não existem milagres. Enquanto a Índia investe 4,8% do PIB em infraestrutura, o Chile 5,1%, a China 13,4% e a Tailândia 15,4%, no Brasil, esse número ronda os 2%. E a Índia pretende quase dobrar o seu aporte até o final de 2017, para conseguir manter o crescimento acelerado, alavancado também por várias reformas estruturais, reformas que temos tido muita dificuldade para avançar aqui.
Interessante é saber que a Alemanha, país competitivo e com ótima infraestrutura, está preocupada com sua taxa de investimento total, que caiu de 26% do PIB, em 1990, para 17%. O que dizer do Brasil, que também investe os mesmos 17%, tendo, todavia, tudo por fazer? Muitos países têm conseguido resolver esse problema melhor do que nós, como mostram os números de 2014: EUA, 19,2%; Rússia, 19,8%; México, 20,9%; Colômbia, 24,7%; Peru, 26,3%; Índia, 29,9%; Coreia do Sul, 30,3%; Indonésia, 31,3% e China, 47,6%. A retomada dos investimentos no Brasil requer uma pauta positiva para o país. Redução de incertezas, restabelecimento da confiança dos agentes econômicos, controle da inflação, equilíbrio fiscal, estabilidade cambial e construção de uma agenda para recuperação da competitividade, que permita aos empresários enxergar que poderão ter retorno nos seus projetos.
Investimentos são importantes porque aumentam a oferta e com isso eliminam gargalos, mas são fundamentais porque permitem aumentos de produtividade. E produtividade talvez seja a variável mais diretamente relacionada à competitividade. Ela tem dois componentes básicos: a do trabalho e a do total dos fatores. A primeira mede a produção média por trabalhador e, para que ele cresça, é necessário que essa produção cresça mais do que os salários. A nossa tem caído porque os salários têm evoluído mais. A segunda mede a eficiência da economia como um todo. Também aqui não estamos bem na fotografia. No período de 1990 – 2013, a produtividade total dos fatores no México cresceu 0,351%; na Indonésia, 0,057%; na Coreia do Sul, 0,620%; nos EUA, 1,073%; na Índia, 1,166%; na China, 3,192 e no Brasil, caiu 0,039%.
Outros países emergentes, inclusive alguns vizinhos sul-americanos, que, como nós, se beneficiaram do superciclo das commodities de 2002 a 2010, continuam conseguindo manter crescimento do seu PIB e da renda per capita. Portanto, por mais que a conjuntura internacional desfavorável atrapalhe, somos vítimas de nós mesmos. O economista americano Nicholas Lardy afirma que não faz mais sentido manter os Brics juntos, considerando que a punica característica em comum era o alto crescimento econômico. Mesmo com o comportamento mais moderado da China, apenas ela e a Índia mantém as credenciais para permanecer no grupo, porque evoluíram em reformas estruturais e na eficiência da economia. Enquanto isso nós aqui estamos muito aplicados cultivando o custo Brasil. Um esforço de algumas das principais entidades da sociedade civil organizada poderia ser um bom início de reação.