Caminhos do Ajuste Fiscal

O Brasil tem sido o país do “sabe, mas não faz” em termos de políticas públicas. Conhecemos os caminhos, mas não temos tido vontade política ou capacidade de articulação para trilhá-los. A necessidade de ajuste fiscal vem sendo discutida já há alguns anos. De um lado, os que advogam pela solução simplista do aumento de impostos para fechar as contas – são os que, a pretexto de defender causas sociais, na verdade defendem privilégios e ineficiência nos gastos públicos. De outro lado, a sociedade, que reclama não haver mais espaço para aumento de tributos. Já temos a mais alta carga tributária entre os países emergentes e a pior relação no planeta entre tributos cobrados e serviços devolvidos à sociedade. Essa é uma evidência de que mais investimentos e melhores serviços públicos não dependem de mais impostos e, sim, de mais gestão.

Importante estudo realizado pelos economistas Alberto Alesina e Francesco Giavazzi, das Universidades de Harvard e Bocconi, concluiu que países que adotaram ajustes baseados em redução de despesas públicas, como Dinamarca e Reino Unido, tiveram recessões muito mais brandas nos anos seguintes – impacto praticamente nulo sobre o PIB nos três anos seguintes. Ao contrário dos que, a exemplo da Itália, escolheram o caminho do aumento de impostos, onde o impacto negativo na economia foi de 2% a 3%, para um ajuste de 1%.

E como bem disse o ex-ministro Antonio Delfim Netto, apoiador do Movimento Brasil Eficiente (MBE), o governo não conseguirá convencer a sociedade de que não há espaço para uma consistente racionalização das despesas públicas. Ele também atribui à exagerada transferência de recursos do setor privado para o setor público parte da responsabilidade pela redução do nosso crescimento econômico.

Além do que, aumentar impostos para fechas as contas é remediar, remendar. Precisamos atacar a causa do problema, que é o excesso de gastos do Poder Público. Só para recordar, uma vez que se discute novamente a necessidade de resolver o grave desequilíbrio da previdência social, no passado, já adotamos a solução simplista de criar novas fontes de receitas como a Cofins, que significa Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. Só protelou a solução e agravou o problema. Aparentemente, a nova equipe econômica tem isso claro.

*Escrito por Carlos Rodolfo Schneider
Publicado originalmente em 18 e 19/06/2016
Fonte: A Notícia.

Governo a serviço da sociedade

Uma das causas da recessão brasileira é a elevada taxa de juros. A mais alta do mundo. É fruto da total dissintonia que existia na área econômica do governo. De um lado, o excesso de gastos públicos correntes pressiona a inflação. De outro, o Banco Central aumenta os juros ou os mantem elevados para conter a inflação. Isto é, política fiscal frouxa requer política monetária austera. Por isso não deu certo a redução da taxa de juros promovida em 2014: faltou reduzir as despesas públicas para que a inflação não fugisse ao controle. Esse modelo tem vários significados.

Primeiro, socializa o custo de ajuste porque gera recessão. Para manter gastos poucos eficientes, obriga famílias e empresas a reduzirem gastos muita mais eficientes. E pior, reduz drasticamente a poupança interna e o nível de investimentos, tanto do poder público, quanto dos agentes privados, comprometendo seriamente a capacidade de crescimento do país. Segundo, que o governo vinha comendo por todos os lados para sustentar o crescimento de suas despesas: impôs uma perigosa rampa de crescimento à divida pública, que também paga os mais altos juros do planeta, além de ter levado a nossa carga tributária a 36% do PIB e a mais de 50% sobre o PIB marginal, a mais alta entre os países emergentes. E mais, o Brasil é o país com a pior relação entre impostos cobrados e retorno para a sociedade.

A sinalização é clara de que a preocupação primeira tem sido a manutenção e o bem-estar do poder público. Preocupação com a construção de uma economia forte e competitiva que possa gerar empregos e renda de forma consistente? Se sobrar espaço. Tanto que o ajuste fiscal proposto no governo anterior ia muito mais para o lado indecente do aumento de impostos do que para a austeridade do gasto público. Onde fica o impreterível esforço para o aumento da eficiência das despesas do governo, para que a partir daí se possa reduzir a carga tributária? A simplificação da caótica estrutura de tributos que inferniza a vida das empresas? O bom senso na concepção de Normas Regulamentadoras (as famosas NRs) do Ministério do Trabalho, que vem gerando custos incompreensíveis às empresas brasileiras? O equilíbrio da legislação ambiental, cujos excessos e o estranho efeito retroativo, paralisam e atrasam obras e punem aqueles que cumpriram a legislação anteriormente vigente? Isso, para ficar em alguns exemplos.

Diversos estudos já demonstraram que fazer o ajuste fiscal pelo lado da redução de gastos é muito mais eficaz do que pelo aumento dos impostos. Reduz a inflação, aumenta a efetividade da política monetária, estimula a atividade econômica, alavanca investimentos e resgata a confiança de famílias e empresas. O inverso é fazer recursos que rendem mais, renderem menos.
Interessante comparar o que fizeram com o Brasil e Peru nos últimos 15 anos, para entender por que estamos retrocedendo quando o nosso vizinho continua numa trajetória boa e firme. Enquanto nós expandimos os gastos sociais e o tamanho do Estado, eles optaram por investimentos em infraestrutura que geraram crescimento consistente, mais empregos, mais salários e um natural processo de inclusão social. A contenção de gastos públicos permitiu ao Peru manter uma carga tributária mais baixa, reestimulando investimentos, uma taxa de inflação sob controle, e, por consequência, taxa de juros também reduzida.

Além disso, o governo peruano trabalha para manter um ambiente de negócios atrativos. Enquanto o Brasil ocupa a 116a posição no ranking Doing Business, do Banco Mundial, o Peru ocupa a 50a. Isso tudo significa que o nosso vizinho se preparou, no período de vacas gordas das commodities, para tempos mais difíceis, que sempre vêm. Ao contrário do Brasil. Ajuda a explicar por que estamos em crise e eles não. Precisamos firmemente reduzir a distância entre o que o poder público nos cobra e o que nos devolve. Sem dúvida, mais investimentos e melhores serviços públicos não requerem mais impostos e sim mais gestão.

*Escrito por Carlos Rodolfo Schneider
Publicado originalmente em 09/06/2016
Fonte: Correio Braziliense.

PLANTAMOS UM MODELO, COLHEMOS UMA CRISE*

A nossa história mostra que o Brasil escolheu ter um Estado forte, ou melhor, grande. Que bom se fosse forte, com capacidade de oferecer à sociedade serviços públicos de qualidade e induzir o processo de desenvolvimento. Ao invés disso, temos um poder público pesado, obeso, lento e caro, que estrangula a sociedade para conseguir se manter. E, como diz o ex-ministro Delfim Neto, que há muito tempo não cabe no nosso PIB.

Pior, esse monstrengo continua crescendo sem parar. A Constituição de 1988 colocou fermento no bolo, criando uma série de direitos sem se preocupar com o equilíbrio fiscal. O inchaço a partir daí foi financiado, num primeiro momento, pelo imposto inflacionário, levando-nos ao processo de hiperinflação, depois pelo crescimento descontrolado da divida pública, seguido de forte expansão da carga tributária, de 25% do PIB para algo em torno de 35%, atualmente. E com a resistência da sociedade a um novo aumento de impostos, o governo apelou novamente à expansão da dívida pública, um dos motivos que nos levou a perder o grau de investimento.

Extraindo cada vez mais da sociedade, o governo vem devolvendo cada vez menos à ela. Enquanto o seu consumo, isto é, o custo para manter a máquina pública funcionando, já chega a 20% do PIB, o investimento da União, fundamental para o país crescer, já encolheu para menos de 1%.

Como diz o economista Paulo Rabello de Castro, coordenador do Movimento Brasil Eficiente (MBE), nem lorde Keynes, que defendia forte participação do Estado na animação da economia, concordaria com o festival d gastança pública no Brasil, que ao invés de resgatar os agentes econômicos, trata de sufocá-los, com um processo pernicioso de realimentação do Custo Brasil.

Algumas medidas estruturantes, que dependem também do Congresso, são imprescindíveis para rompermos essa trajetória insustentável. Flexibilizar o orçamento público é uma das medidas, que tem 89% dos gastos engessados, contra, por exemplo, 67% nos Estados Unidos, 64% no Reino Unido e 53% no Japão. Reformar a Previdência Social, que vem multiplicando o seu déficit, e desindexar a economia, para evitar que a inflação passada continue pressionando os gastos e retroalimentando o processo, também são imprescindíveis. Criar um Conselho de Gestão Fiscal, por sua vez, ajudaria muito na eficiência dos gastos públicos.

Temos que fazer o Estado perder as gorduras que custam caro demais à sociedade brasileira e adquirir sendo de urgência para as mudanças necessárias.

*Escrito por Carlos Rodolfo Schneider
Publicado originalmente em 19/05/2016
Fonte: Diário Catarinense e A Notícia.

Para restabelecer a coerência

Para um rápido diagnóstico das contas públicas, é interessante compararmos alguns números de hoje com os de 20 anos atrás. Naquela época, as despesas não financeiras, isto é, o consumo do governo central, equivalia a 11% do PIB. Hoje, representa 20%. Esse crescimento, juntamente à expansão dos demais gastos correntes (juros, previdência e assistência social), levaram a carga tributária a avançar de 25% para 36% do PIB no período. E pior, comprometeu os investimentos, mola propulsora para a expansão da economia, que caíram de 25% do PIB para os 17% ou menos de hoje. E destes 17%, não mais de dois pontos percentuais são investimentos do poder público, incluindo Estados e municípios. A União, sozinha, gasta com a manutenção  da estrutura (a maior parte é gasta com pessoal) 20% do PIB e não consegue investir nem 1%.

Para termos alguma chance de recuperar a saúde fiscal do país, o Estado deve parar de avançar sobre a criação de riqueza dos brasileiros. Isso significa que os gastos do governo devem passar a crescer menos que o PIB. Ao contrário do que aconteceu no período de 2004 a 2014, quando para um aumento anual médio do PIB de 3,6% a arrecadação federal avançou à taxa de 5,3% ao ano e as despesas correntes federais ao ritmo de 8,1%. Deu no que deu.

O Movimento Brasil Eficiente (MBE) propõe a criação da Lei de Controle Orçamentário para restabelecer o equilíbrio das nossas contas. Inicialmente, um Programa Emergencial estabeleceria limitadores para as despesas correntes para todas as rubricas do orçamento público. A segunda etapa, um Programa Estrutural, tornaria o gasto público mais eficiente, com ganhos permanentes, a partir da criação de um conselho de Gestão Fiscal – a exemplo do Stability Council, da Alemanha, e do Budget Control Act, dos Estados Unidos – , do não engessamento do orçamento e da desburocratização da economia, da simplificação do sistema tributário e das reformas previdenciária e trabalhista. Vencidas, as duas primeiras etapas, viria um Programa Financeiro, com a redução da taxa de juros para níveis internacionais e forte recuperação dos investimentos.

É uma proposta para restabelecer a coerência, na qual o Poder Público serve ao público e não dele se serve.

Texto publicado no dia 27 de março de 2016 no jornal Diário Catarinense, A Notícia e Jornal de Santa Catarina.

Previdência: sem desperdício da crise

Em 2014, o Regime Geral da Previdência Social (INSS), que atende aproximadamente 27 milhões de trabalhadores do setor privado, apresentou R$ 56 bilhões de déficit, enquanto o Regime Próprio dos Servidores, que assiste em torno de um milhão de funcionários públicos, registrou um rombo de R$ 65 bilhões. Uma flagrante distorção que precisa ser corrigida, por estar privilegiando de forma imoral aqueles que por definição deveriam servir o público e não dele servir-se.

A criação dos fundos de previdência complementar dos servidores, que procuram equiparar os regimes públicos àqueles que se aplicam ao trabalhador privado, mas que infelizmente só vigoram para novos entrantes do serviço público, de qualquer forma, é uma luz no fim do túnel, mesmo com a evolução lenta que vem tendo. O Funpresp, fundo criado em 2012 pela União, por exemplo, teve a adesão de menos da metade dos 33 mil novos servidores federais do período.

Outros países também sofrem com desequilíbrios nas contas da previdência. O Chile, por exemplo, fez mudanças importantes como a privatização da previdência em 1981, com a criação dos fundos de capitalização, nos quais as pessoas contribuem de acordo com o nível de aposentadoria desejado.

Ajustes são necessários para as populações mais pobres que não tem conseguido criar as suas contas, mas isso faz parte do processo de aprimoramento do sistema. Lá também foi criado um programa similar ao FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) que temos aqui, mas que ampara com muito mais eficácia o trabalhador.

Enquanto no Brasil o FGTS fica depositado na Caixa Econômica Federal e rende 3% ao ano, portanto, menos que a inflação, no Chile, as empresas depositam mensalmente um valor proporcional ao salário numa conta do empregado, que pode escolher o banco de sua preferência, remunerando-o com juros de mercado.

A destacar que é desse fundo que vêm os recursos para manter o trabalhador quando estiver desempregado, o que o faz procurar novo emprego o mais rápido possível para não onerar a sua conta. Enquanto isso, no Brasil, mais de 90% dos beneficiários do seguro desemprego só voltam a buscar trabalho com registro na carteira depois de receberem todas as parcelas a que tem direito.

Curiosamente só recentemente, e talvez inspirado no exemplo chileno, foi aprovada na Câmara, e agora tramita no Senado, proposta que remunerará os novos depósitos do FGTS a taxas crescentes, equiparando-as à da poupança em 2019. As distorções da nossa previdência são parte importante dos problemas no país. Tomara que a atual crise permita florescer a vontade política para prosperarem as mudanças necessárias. O Brasil merece.

Texto originalmente publicado em 21.11.2015 no Jornal Notícias do Dia.