Cuidados com armadilhas fiscais

O novo governo ainda está em seus primeiros passos, há muitas prioridades a sinalizar, mas espera-se que a área econômica logo aponte caminhos consistentes para encarar o problema fiscal do país. Nossas receitas estão perigosamente esticadas: 33% de carga tributária, quase 80% de dívida e déficit primário de 2% do PIB. A sociedade transfere recursos em demasia para o poder público – de quem gasta bem para quem gasta mal –, o que afeta fortemente a eficiência da economia e a taxa de produtividade.

O que vale para a União, vale para estados e municípios. Não por acaso, o Rio de Janeiro, estado com o maior desequilíbrio nas contas públicas, é o que mais recebeu e tem recebido recursos: para a Copa do Mundo de Futebol, para a Olimpíada e pela arrecadação de royalties do petróleo. Nos primeiros oito meses de 2018, mais de R$ 13 bilhões foram injetados nos cofres públicos do Rio. Segundo Raul Velloso, especialista em contas públicas, a fartura de recursos é que leva à corrupção, ao desperdício e à ineficiência dos gastos nos governos.

Não faltam provas dessa constatação. Como, por exemplo, pagamentos indevidos do Bolsa-Família, aposentadorias por invalidez e auxílio doença no montante de R$ 10 bilhões em menos de um ano. E uma expectativa de encontrar outros R$ 20 bilhões de benefícios irregulares nos próximos dois anos.

É premente uma revisão do papel do Estado, que hoje gasta 20% do PIB para manter a máquina pública e não consegue investir nem 2% para prestar serviços de qualidade e ajudar a prover a infraestrutura necessária ao crescimento do país.

A manutenção de inflação e juros baixos, alcançados em boa medida pelo baixo nível da atividade econômica, dependem, em grande parte, do aumento de investimentos que permitam ampliar o PIB potencial. Infelizmente, esses investimentos são os primeiros a serem sacrificados quando aperta o caixa do governo. A inversão do quadro passa por ajustes fortes, pela reforma da Previdência, pelo aumento de eficiência das despesas, para viabilizar a sobrevivência da importante Lei do Teto dos Gastos, de 2017. Segundo o governo, em 10 anos essa lei permitiria a despesa pública federal cair dos atuais 20% do PIB para 15%, patamar vigente em 2005, quando a carga tributária era menor e a capacidade de investimento do Estado maior.

Espera-se, também, que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes avancem em providências para aprovar a reforma da Previdência logo, pela relevância que tem para o ajuste fiscal.

Tão importante quanto reduzir gastos é evitar aumentos de despesas e renúncias de receitas, como se espera do governo do novo presidente da República. Yoshiaki Nakano, diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas, propõe criar limite de endividamento para o Tesouro, a exemplo do que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) já determina para estados e municípios. Já é hora de implantarmos no país uma instituição fiscal independente, importante instrumento para auxiliar na qualidade do gasto público e na moderação da carga tributária.

A responsabilidade fiscal permitirá ao governo criar reservas, através de superávits primários consistentes, nos períodos de crescimento, para atravessar os períodos difíceis, que sempre vêm. Infelizmente, destinamos as sobras do período de boom das commodities a aumentos de gastos permanentes. Com isso, criamos a nossa armadilha fiscal.

Publicado no Jornal Estado de Minas.

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