Prazo para apagar incêndio?

O governo recém-empossado tem o desafio de enfrentar uma forte crise das contas públicas, cujo auge aconteceu em 2015, quando o déficit nominal chegou a 10,2% do PIB, vindo de 2,3% em 2012 e com previsão de fechar 2018 com 7,3%. Um recuo importante, fruto de reformas já implementadas nos últimos dois anos, como a Lei do Teto de Gastos. Para que essa trajetória se sustente e possa continuar, todavia, é imprescindível que outras medidas sejam implantadas, a começar pela reforma da Previdência, para desarmar uma verdadeira bomba-relógio fiscal. Representando já mais da metade dos gastos públicos primários, aposentadorias e pensões constituem, de longe, a maior fonte de desequilíbrio das finanças do governo.

A discussão que se estabeleceu é sobre a pressa de implantar as mudanças. Certamente, tudo que não for feito hoje será mais caro amanhã. Além de deixar o país mais vulnerável a choques, como nos mostrou o recente exemplo da Argentina, onde o presidente Mauricio Macri criou um plano para modernizar a economia do país e formou equipe altamente qualificada. Imaginou, porém, que teria condições favoráveis para implantar as medidas gradualmente. Só não contava com a quebra da safra agrícola e com a deterioração das condições externas, que desencadearam um ataque especulativo à moeda do país, derretendo conquistas importantes do seu governo e obrigando-o a bater às portas do Fundo Monetário Internacional para evitar a insolvência. Maquiavel já havia alertado que o mal se faz de uma vez e não aos poucos. É no início do governo, antes da deterioração do capital político.

Exemplos de outros países mostram que os esforços para superar crises financeiras com cortes de gastos públicos valem a pena, ao contrário dos que buscam a solução no aumento de tributos, que não passa de maquiagem tóxica. A Dinamarca, por sua vez, demonstra que a escolha não deve ser entre Estado grande ou pequeno, e sim entre obeso ou musculoso, entre eficiente ou ultrapassado.

É hora de apagar incêndio. Pedir prazo numa hora dessas não parece razoável.

Publicado em 24/01/2019 nos jornais Diário Catarinense e A Notícia.

Cuidados com armadilhas fiscais

O novo governo ainda está em seus primeiros passos, há muitas prioridades a sinalizar, mas espera-se que a área econômica logo aponte caminhos consistentes para encarar o problema fiscal do país. Nossas receitas estão perigosamente esticadas: 33% de carga tributária, quase 80% de dívida e déficit primário de 2% do PIB. A sociedade transfere recursos em demasia para o poder público – de quem gasta bem para quem gasta mal –, o que afeta fortemente a eficiência da economia e a taxa de produtividade.

O que vale para a União, vale para estados e municípios. Não por acaso, o Rio de Janeiro, estado com o maior desequilíbrio nas contas públicas, é o que mais recebeu e tem recebido recursos: para a Copa do Mundo de Futebol, para a Olimpíada e pela arrecadação de royalties do petróleo. Nos primeiros oito meses de 2018, mais de R$ 13 bilhões foram injetados nos cofres públicos do Rio. Segundo Raul Velloso, especialista em contas públicas, a fartura de recursos é que leva à corrupção, ao desperdício e à ineficiência dos gastos nos governos.

Não faltam provas dessa constatação. Como, por exemplo, pagamentos indevidos do Bolsa-Família, aposentadorias por invalidez e auxílio doença no montante de R$ 10 bilhões em menos de um ano. E uma expectativa de encontrar outros R$ 20 bilhões de benefícios irregulares nos próximos dois anos.

É premente uma revisão do papel do Estado, que hoje gasta 20% do PIB para manter a máquina pública e não consegue investir nem 2% para prestar serviços de qualidade e ajudar a prover a infraestrutura necessária ao crescimento do país.

A manutenção de inflação e juros baixos, alcançados em boa medida pelo baixo nível da atividade econômica, dependem, em grande parte, do aumento de investimentos que permitam ampliar o PIB potencial. Infelizmente, esses investimentos são os primeiros a serem sacrificados quando aperta o caixa do governo. A inversão do quadro passa por ajustes fortes, pela reforma da Previdência, pelo aumento de eficiência das despesas, para viabilizar a sobrevivência da importante Lei do Teto dos Gastos, de 2017. Segundo o governo, em 10 anos essa lei permitiria a despesa pública federal cair dos atuais 20% do PIB para 15%, patamar vigente em 2005, quando a carga tributária era menor e a capacidade de investimento do Estado maior.

Espera-se, também, que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes avancem em providências para aprovar a reforma da Previdência logo, pela relevância que tem para o ajuste fiscal.

Tão importante quanto reduzir gastos é evitar aumentos de despesas e renúncias de receitas, como se espera do governo do novo presidente da República. Yoshiaki Nakano, diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas, propõe criar limite de endividamento para o Tesouro, a exemplo do que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) já determina para estados e municípios. Já é hora de implantarmos no país uma instituição fiscal independente, importante instrumento para auxiliar na qualidade do gasto público e na moderação da carga tributária.

A responsabilidade fiscal permitirá ao governo criar reservas, através de superávits primários consistentes, nos períodos de crescimento, para atravessar os períodos difíceis, que sempre vêm. Infelizmente, destinamos as sobras do período de boom das commodities a aumentos de gastos permanentes. Com isso, criamos a nossa armadilha fiscal.

Publicado no Jornal Estado de Minas.