Desafios da indústria brasileira

Especialmente nos últimos 15 anos, procuramos apoiar o nosso crescimento econômico em três pilares: preços das commodities, gastos do governo e aumento do consumo das famílias. Não nos preocupamos em construir as bases para um crescimento sustentável, que passam por uma taxa de investimento mais robusta e o aumento da produtividade da economia.

O Banco Mundial alerta que se o país não reformular o seu modelo de desenvolvimento, certamente perderá as conquistas socioeconômicas dos últimos anos, comprometendo os avanços na redução da pobreza. O banco reconhece os avanços sociais, mas aponta que, por outro lado, houve forte elevação de carga tributária, encolhimento dos investimentos e perda de dinamismo da economia. A baixa produtividade seria provocada por um sistema que limita a concorrência, pelo fechamento econômico, e aloca mal os recursos.

Para compensar os elevados custos de produzir no país, o governo cria mecanismos de proteção e compensação que não são eficientes. O estudo sugere a inversão da pauta: abrir o mercado, reduzir o Custo Brasil e aumentar a eficiência dos gastos públicos. Mas reconhece ser uma pauta politicamente desafiadora, porque depende de reformas. Na realidade, o estudo reforça o que entidades empresariais como CNI, FIESP e FIESC vem defendendo há muito tempo: a indústria não precisa de proteção, e sim de um ambiente que lhe permita competir em igualdade de condições. O que está longe da realidade, como demonstra o trabalho “Desempenho da Indústria no Mundo”, da Confederação Nacional da Indústria (CNI). De 2006 a 2016, a participação do país na produção mundial de manufaturados caiu de 2,74% para 1,84% e, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), as exportações da indústria reduziram de 0,82% para 0,58% do total. No mesmo período, a China aumentou a sua fatia de 9,31% para 18,14%. Segundo a CNI, esse retrocesso se deve à dificuldade de competição da nossa indústria, enquanto em países como China, México e Coreia do Sul, ela tem sido o principal vetor de crescimento.

 

Publicado no Diário Catarinense e A Notícia – 06/04/18

A conta vai para os filhos e netos

Em evento organizado pela Confederação Nacional do Comércio, o então ministro do Planejamento Dyogo Oliveira informou que 57% de todo o gasto do governo hoje é com a Previdência e apenas 2% com investimento. E afirmou: “Estamos gastando com o passado e nada com o futuro”. Considerando que as contas públicas apresentaram déficit de R$ 124,4 bilhões em 2017, as demais contas do orçamento tiveram que fazer um superávit de R$ 144 bilhões para cobrir o rombo de R$ 268 bilhões da Previdência. O que estaria emperrando a aprovação da reforma, segundo o ministro, seria principalmente a pressão de setores que hoje são indevidamente beneficiados para manter privilégios.

O economista José Márcio Camargo, professor da PUC Rio, observou, no mesmo evento que “se hoje gastamos 57% do orçamento com Previdência Social, em 20 anos serão 100%”. Com os sucessivos adiamentos, a cada dia perdido a reforma terá que ser mais dura. E ainda: o rombo dos benefícios pagos ao setor público somou R$ 1,292 trilhão entre 2001 e 2015, muito mais do que o governo gastou com saúde e educação nesse período. Na sua avaliação, a Previdência tende a ser hoje o maior mecanismo de concentração de renda no país.

O nosso problema de seguridade social é provocado por um misto de envelhecimento acelerado da população, privilégios, má gestão, desvio e aposentadorias precoces. No que se refere à idade média de aposentadoria, levantamento feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que os 59 anos de aposentadoria do Brasil são incompatíveis com a curva demográfica do país, especialmente se comparados com a idade de outras nações: média de 64 anos nos países da OCDE, chegando a 69 no Chile e Japão, a 71 na Coreia do Sul e 72 no México. Alemanha, Estados Unidos e Holanda, por exemplo, já aprovaram regras para elevar a idade mínima para 67 anos, com igualdade de regras para homens e mulheres. Na Alemanha, existe um período de transição até 2029 para os nascidos até 1964. Para os demais, já vale o aumento de 65 para 67 anos.

No Japão, país com a maior proporção de idosos na população, existe uma lei que obriga reforma da Previdência a cada cinco anos. Todos os países que praticam a responsabilidade fiscal buscam de forma ordenada adequar as regras à sua curva demográfica e à realidade orçamentária. No Brasil, precisamos entender que ninguém resolverá esse problema por nós, e que adiamentos e desidratações da proposta simplesmente transferem um pouco para a frente contas cada vez mais altas a pagar, especialmente pela população mais pobre, que não passa de massa de manobra daqueles que defendem privilégios. Isso fica claro nas informações fornecidas pelo secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano: na proposta apresentada em dezembro último, apenas 9,5% dos trabalhadores teriam uma perda de renda superior a 1% da aposentadoria, poupando a população mais carente.

Os generosos fluxos de recursos, que privilegiaram o Rio de Janeiro na Copa do Mundo, nas Olimpíadas e com royalties do petróleo, não foram suficientes para compensar a falta de gestão e a corrupção no governo do estado. Com a intervenção decretada, a União passa a coordenar os esforços da segurança em meio ao caos que tomou conta do Rio. Com o dinheiro dos contribuintes de todo o país. Com isso, a votação da reforma da Previdência teve que ser suspensa por determinação constitucional. Temos ouvido, de políticos e jornalistas, que foi uma grande derrota do governo. Leitura equivocada. A derrota claramente é do país. Não podemos esquecer que os excessos que cometemos hoje são exatamente a conta que estamos transferindo aos nossos filhos e netos. Não creio que queiramos isso.

 

Publicado no dia 18/04 no jornal O Estado de Minas.

Previdência: a derrota do país

O Brasil que saiu da Constituição de 1988 não era compatível com o tamanho do PIB. A afirmação é do economista Mansueto Almeida, secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. A estrutura de bem-estar social criada levou a gastos equivalentes aos de países desenvolvidos como Noruega e Alemanha – em torno de 25% do PIB – e superior aos 21% gastos no Reino Unido.

O gasto com proteção social no Brasil é o maior do continente, segundo levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Destinamos a essa conta, excluindo o gasto com saúde, 13,2% do PIB, contra 10,6% nos Estados Unidos, 9,7% no Canadá, 8,7% na Colômbia, 8,1% no México, 3,1% no Peru e 3% no Paraguai. No modelo atual, o gasto com previdência social dos trabalhadores do setor privado e especialmente dos servidores públicos não cabe no orçamento, mesmo suportado por uma carga tributária que oscila entre 32% e 35% do PIB, bem mais pesada do que a carga média dos países da América Latina, de 22%.

O rombo da Previdência chegou a R$ 268,8 bilhões em 2017, um crescimento de 18,5% sobre 2016. O INSS, que atende 29,8 milhões de trabalhadores da iniciativa privada, teve déficit de R$ 182,4 bilhões, e o regime próprio dos servidores públicos, que assiste menos de um milhão de vidas, apresentou déficit de R$ 86,3 bilhões. Isso significa que, no setor privado, o rombo por pessoa assistida foi de aproximadamente R$ 6 mil e, no setor público, de R$ 87 mil. As despesas com a Previdência consomem 57% de todo o gasto do governo, levando a disponibilidade para investimentos, essenciais para o crescimento do país, a ficarem em parcos 2%. Como afirmou o ministro do Planejamento Dyogo de Oliveira, estamos gastando com o passado e não com o futuro.

O ministro da Fazenda Henrique Meirelles tem alertado que se os ajustes no modelo não forem feitos, em poucos anos a previdência vai comprometer seriamente os gastos com saúde, educação e segurança pública do país, a exemplo do que vem acontecendo em alguns Estados. O governo será obrigado a cortar salários e aposentadorias como fizeram Portugal e Grécia no final da última década.

Portanto, aprovar a reforma da Previdência não é uma opção, é uma obrigação. Questão de responsabilidade cívica de deputados e senadores.

Lamentavelmente, por previsão constitucional, a intervenção da União do Rio de Janeiro obrigou a suspensão da tramitação da reforma no Congresso Nacional. Alguns jornalistas e políticos da oposição tem qualificado o fato como uma grande derrota do governo. Leitura equivocada. O governo envidou todos os esforços para viabilizá-la, e isso não há como negar. A derrota claramente é do país.

 

Publicado em 06.03.2018 no Jornal A Tarde – Salvador em 06/03/18.

 

Perdendo oportunidades

Passada a trégua do fim do ano, para que os votos de um bom ano-novo tenham alguma chance de se concretizar, é fundamental retomar a busca de uma solução para a Previdência, grande algoz das conquistas econômico-sociais dos últimos anos. A discussão deve ser técnica, construtiva, desinteressada. A alteração do perfil demográfico da população brasileira requer uma revisão das regras da nossa seguridade social, que tem sido bastante generosa, especialmente a partir da Constituição de 1988.

Com o envelhecimento da população, os que trabalham não conseguem mais pagar os benefícios do crescente contingente de aposentados. Por isso, além da revisão de privilégios, o principal objetivo é desarmar um conflito entre gerações, entre jovens e idosos, entre os que usufruem e os que terão que pagar a conta. Temos que definir se queremos nossos filhos e netos pagando as nossas contas ? contas desajustadas.

Não há dúvida de que todos terão que participar desse esforço, até porque nos aposentamos muito cedo no Brasil. Mas também seria justo que quem mais contribuiu para o desequilíbrio pague uma conta maior. As estatísticas mostram que 9,4 milhões de trabalhadores rurais geraram um rombo de R$ 101,6 bilhões em 2016, R$ 10,7 mil por beneficiário, muito mais do que os R$ 1,5 mil de déficit por trabalhador urbano da iniciativa privada. Portanto a previdência rural requer uma solução, obrigatoriamente. Por outro lado, no RGPS, que atende os servidores públicos civis da União, 623,5 mil beneficiários provocaram um rombo de R$ 43,1 bilhões, 68,1 mil por servidor. Fica claro, portanto, por que a proposta que está no Congresso dá atenção especial aos regimes próprios dos servidores.

Incluindo os militares, o regime da Previdência da União acumulou em 2016 um resultado negativo de R$ 77 bilhões para assistir pouco menos de 1 milhão de beneficiários. E, no longo prazo, a projeção do resultado é de R$ 8,2 trilhões negativos. Felizmente, os servidores que entraram para o serviço público federal a partir de 2003 ficam sujeitos a regras similares aos trabalhadores da iniciativa privada, e podem aderir à previdência complementar estabelecida com a criação da Funpresp.

Mas o problema não está só na União. Os 1,5 milhão de servidores estaduais aposentados geraram, em 2016, um rombo de R$ 90 bilhões, e a projeção do resultado no longo prazo aponta déficit de R$ 4,6 trilhões. Apenas 8 dos 26 estados e o Distrito Federal criaram até agora regimes de previdência complementar que permitirão o equilíbrio no futuro. É urgente que os demais também o façam, seguindo o protagonismo do estado de São Paulo. Nos municípios, a situação é mais confortável, mas já aponta desequilíbrios no longo prazo, sendo recomendável também a criação da previdência complementar.

No global, União, estados e municípios gastam 3,5% do PIB para pagar a aposentadoria de servidores, contra uma média de 1,4% de 17 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) pesquisados. Isso significa que o Brasil gasta a mais com aposentadoria de servidores públicos do que os países ricos, o que daria para triplicar os investimentos feitos no país pelo poder público. É a sociedade servindo ao governo. É o rabo balançando o cachorro.

Os excessos e o aposentar-se muito cedo não cabem mais nas contas da nossa Previdência. A idade média de aposentadoria de 59 anos, no Brasil, contra 64 na OCDE; 65, na Austrália e nos Estados Unidos; 66, na Suécia; 68, em Portugal; 69, no Chile; e 72 ,no México, apontam uma distorção que deve ser corrigida.

Os dados mostram quem deve contribuir mais com essa reforma. Mas é inquestionável que ela é urgente, pois além do déficit atual, as despesas continuam crescendo muito acima das receitas. Se não acontecer, o rombo terá que ser financiado de duas formas: forte aumento da carga tributária (que a população já não aceita mais) ou descontrole inflacionário, com consequências que o passado não muito distante não nos deixa esquecer. Caso o teto constitucional dos gastos públicos viesse a ser respeitado, prevê o economista Marcio Garcia, o governo ficaria paralisado, hospitais, escolas e serviços públicos essenciais não teriam mais recursos. O orçamento iria todo para o pagamento do funcionalismo, ativos e aposentados. Certamente não é isso que os brasileiros querem, nem mesmo os próprios servidores.

Se não fizermos a reforma da Previdência agora em 2018, ela certamente ficará mais cara em 2019. E, então, mais uma vez o economista e ex-ministro Roberto Campos terá tido razão quando afirmou que o Brasil nunca perde a oportunidade de perder oportunidades. Tomara que não.

 

Publicado no Jornal Correio Braziliense em 26.01.2018

Para acabar com o manicômio tributário

O relatório “Doing Business 2017: Medindo Qualidade e Eficiência”, do Banco Mundial, é um dos vários rankings que vêm apontando a queda de competitividade do Brasil. Entre 189 países pesquisados, caímos para a 123ª posição, vindo da 116ª em 2016 e da 111ª, em 2015. Os ex-ministros da Fazenda Maílson da Nóbrega e Joaquim Levy apontam que a reforma tributária, a começar pela simplificação da estrutura de impostos, é essencial para elevarmos a eficiência, a produtividade e a competitividade da nossa economia. Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, afirma ser essa a agenda mais poderosa para aumentar a produtividade nos próximos anos, e recomenda a criação de um imposto sobre valor agregado para substituir os atuais tributos. A planilha que uma empresa de bens de consumo precisa preencher na Europa para recolher tributos tem 50 linhas. O programa usado no Brasil tem 20 mil linhas. É o nosso manicômio tributário.

O Movimento Brasil Eficiente (MBE) vem há vários anos trabalhando essa agenda e tem levado à discussão, especialmente no governo federal e no Congresso Nacional, o que chamou de Plano Real dos Impostos, uma proposta alicerçada nos seguintes pontos:

  • aglutinação de diversos tributos em um único Imposto sobre Valor Agregado na Circulação;
  • a criação de uma Operadora Nacional da Distribuição da Arrecadação, que garantirá a distribuição dos impostos de forma rápida, desburocratizada e neutra (sem ganhadores nem perdedores) a todos os entes da Federação;
  • o Novo Imposto de Renda agrupando o atual à Contribuição Social Sobre Lucro Líquido para cobrir os gastos da Previdência Social, inclusive a dos servidores públicos;
  • a criação do Conselho de Gestão Fiscal , para que a sociedade possa dar contribuição efetiva ao aumento da eficiência do gasto público.

A proposta foi elaborada pelo economista Paulo Rabello de Castro e pelo jurista Gastão Toledo, com a preocupação de acabar com a guerra fiscal, e construir um sistema claro e transparente; simples para quem paga, para quem arrecada e para quem fiscaliza. A PEC do MBE para a simplificação tributária vem sendo avaliada, e a criação do CGF já foi aprovada no Senado por proposição do senador Paulo Bauer. Agora tramita na Câmara dos Deputados — Projeto de Lei Complementar 210/2015.

Por outro lado, foi apresentada a uma comissão especial na Câmara a proposta de simplificação tributária do deputado Luiz Carlos Hauly, com quem o MBE interagiu intensamente. Mesmo tendo permanecido diferenças conceituais, entendemos que a sugestão convergiu em muitos pontos para o pensamento do MBE. A eliminação de dez impostos, a criação de um imposto sobre valor agregado e de mecanismos que acabem com a guerra fiscal serão propostos através de 11 projetos de lei e uma emenda à Constituição. Cabe ao Congresso entender a importância desse avanço.

O MBE entende que só com o aumento da eficiência do gasto público será possível reduzir esse peso de impostos, que, mesmo onerando mais uns do que outros, já é um lastro insuportável para todos. Pagamos com não competitividade.

 

Publicado no Jornal O Globo em 27/12/17
Link do artigo: https://m.oglobo.globo.com/opiniao/para-acabar-com-manicomio-tributario-22230177